Era Pré-Espartana | > 2008

Micropatriologia mauritana em Reunião

Esparta, no mundo das ideias, nasce em meados da década de 2000. Seu nascedouro foi influenciado pelos projetos micropatriológicos produzidos no Vice-Reino de Mauritius, território semiautônomo do Sacro Império de Reunião (SIR), com referencial geográfico das Ilhas Maurício, próximo à ilha de Reunião, no Oceano Índico.

Com a nomeação de R. Mariano como Vice-Rei de Mauritius, a família Murta-Ribeiro, uma das casas nobres mais antigas do Império, reunindo F. Sales, C. Goes, B. Sogdu, D. Silva e R. Mariano, entre outros, passou a dotar o território mauritano como ponto referencial para os estudos e produção da Fundação Theobaldo Salles. A entidade socioculturalista e micropatriológica, que publicava artigos que traziam um olhar acadêmico sobre o hobby micronacional, contava com a produção intelectual de C. Góes, B. Cava, R. Garcia, F. Aron, entre outros micronacionalistas das primeiras gerações do hobby no Brasil.

Os debates propostos nos diversos artigos publicados pela fundação nos muitos exemplares do Socioculturalista, publicado pelo Micropatriologia, exploravam o conceito de sentimento de nação no micronacionalismo. Resultado de vivências coletivas de experiências micronacionais em projetos com traços culturais consolidados e visão unificada de propósito, a micropatriologia estudava os laços entre micronacionalistas e os projetos que construíam juntos, uma alternativa ao polemicismo reunião, que vinha pautando a atividade micronacional naquele início de década.

A produção mauritana atraía, igualmente, novos micronacionalistas, reuniãos recém-chegados com forte potencial para o exercício do hobby – um boom de novos micronacionalistas havia ocorrido na primeira metade da década de 2000, trazendo, inclusive, R. Mariano ao micronacionalismo -, e nomes antigos na estrutura reuniã, como os próprios F. Sales. e C. Góes. No mesmo período, as demais regiões do Império, chamadas capitanias, viviam uma baixa de atividade e escassez de mão de obra disponível.

Em 2007, impasses na administração das liberdades que a semiautonomia do Vice-Reino, garantidas pela Sagrada Constituição Imperial Reuniã e confirmadas pela Carta Magna Mauritana, geraram constrangimentos entre o Palácio de Hansard – o palácio real e sede do Poder Moderador em Mauritius – e a Chancelaria Imperial. A esse cenário somavam-se tensões com E. de Lagrenge, Arquiduque de Pacífica e Lorde de Mauritius, graças a concessões constantes no tratado de anexação do antigo Império de Pacífica ao Sacro Império de Reunião, anos antes. Lagrange tinha poder para distribuir títulos nobiliárquicos e, como Mauritius, ensaiava uma atuação diplomática. Os embates entre Lagrange e o Gabinete do Lorde Protetor aceleraram os processos que viriam a seguir.

O impasse em Mauritius durou quase dois anos, durante os quais o próprio imperador de Reunião se manteve distante. Naquela altura, a experiência mauritana era apresentada como exemplo prático nos artigos micropatriológicos da Fundação Theobaldo Salles, com ênfase no sentimento mauritano, uma vertente do reunionismo nascida no Vice-Reino. A soma de todos esses fatores criou uma conjuntura insustentável de enfrentamento. Dentro das Forças Armadas e de Inteligência Imperiais, a desconfiança sobre Mauritius e a família Murta-Ribeiro cresceu até que a crise alcançasse seu ápice.

A família Murta-Ribeiro foi expulsa de Reunião, sob acusação de tramar um golpe para proclamar o Vice-Reino de Mauritius independente. Não se sabe, até hoje, se houve ou não, no seio da tradicional família reuniã, a intenção de moldar a opinião dos mauritanos na direção a uma revolução.

Em artigo publicado em janeiro de 2009 na 15ª edição d’O Socioculturalista, C.Góes, já em Pasárgada, conta o episódio mauritano:

R. Mariano foi mantido no trono de Hansard pelo Imperador Cláudio Castro de Reunião mas, com a saída do núcleo duro do Conclave dos Lordes, a atividade não se recuperou. A partir de 2007, expulsos de Reunião, Felipe S. e Carlos G. de Murta-Ribeiro tomaram parte do grupo que organizou a última reativação do Estado Livre de Pasárgada, micronação da primeira geração de micronações brasileiras, com fortes influências republicanas e socialistas. R. Mariano renunciou ao Cetro Mauritano no final daquele mesmo ano.

As bases para a restauração espartana –
A rebelião Murta-Ribeiro e o Império de Pacífica

Quando deixou Reunião, R. Mariano de Murta-Ribeiro já havia nutrido laços de amizade e cooperação intermicronacionais nas principais micronações que, na época, trabalhavam por um micromundo multipolar, menos dependente do fazer micronacional reunião. O Kaiser do Império alemão, Guilherme III Luís – falecido em 2024 – e Giancarlo Z., o Grão Duque de Petroburgo, desempenharam papéis cruciais na fundação da Diarquia Democrática de Esparta.

Antes mesmo da sistematização dos princípios fundamentais do projeto, as articulações visando o reconhecimento diplomático já estavam em andamento. Em meados da década de 2000, novas micronações raramente sobreviviam aos primeiros meses, a menos que conquistassem o respeito e aceitação das micronações consolidadas da lusofonia. Havia, ainda, uma forte rejeição a qualquer nova iniciativa micronacional. Para os soberanos da época, a pluralidade intermicronacional não era razão suficiente para justificar a existência de micronações já consolidadas, que enfrentavam listas de comunicação vazias e baixa atividade interna.

O Império de Pacífica também teve papel importante no nascedouro da Cidade-Estado. Com a falência da longa experiência micronacional realizada em Mauritius, somada ao isolamento de E. de Lagrange em solo reunião, resultou na elaboração dos planos para a restauração do Império de Pacífica. Lagrange havia reunido em torno de si micronações que, teoricamente, teriam projetos sólidos o suficiente para, juntas, reativarem o projeto de Pacífica.

Após meses de pesquisa e planejamento, com o site em produção e listas criadas para abrigar sua produção e comunicações oficiais, o até então R. Mariano – agora Mariano de Ágide – publicou nas listas de distribuição de informações intermicronacionais, em 08 de agosto de 2008, o documento que marca a fundação da Pólis, o “Manifesto ao mundo que (re)nasce”.

O Manifesto ao Mundo que (re)nasce –
Mensagens e intenções que retratam um período micronacional

Analisar o texto do Manifesto ao Mundo que (re)nasce é iluminar um momento quase esquecido do micronacionalismo lusófono. Contudo, o primeiro parágrafo mantém um diálogo atemporal com os dias atuais. A Esparta nascente era resultado da “vontade de liberdade de um povo”, referência direta aos anos pré-espartanos no Vice-Reino de Mauritius, em Reunião.

Os traços do projeto de estudo e publicações sobre a micropatriologia da Fundação Theobaldo Sales também aparece aqui, em destaque, na declaração de vida una, uma “experiência microssocial, espelho da vida macrossocial e indivisivelmente contida nela”. A “filosofia” apontada no segundo parágrafo também aponta para a produção intelectual da Casa Murta-Ribeiro no início da década de 2000. O pensamento-raiz que norteava a produção da família volta a aparecer mais à frente, no sétimo parágrafo, no trecho em que o manifesto define os primeiros esparciatas como “homens livres, pensadores da vida – a única que temos, sem divisões macro ou micro”.

A dicotomia “monarquias x repúblicas”, abordada no terceiro parágrafo, introduziu as intenções do projeto, que pretendia, que buscava, acima de tudo, transcendê-la. Foi justamente a busca por um modelo que garantisse a participação democrática ampla e irrestrita, pouco centralizada, que as pesquisas que deram forma ao projeto chegaram ao helenismo inspirado na tradição espartana. Contraditório, o projeto que tinha como referência uma Cidade-Estado conhecida mundialmente pela Guerra, buscava, na verdade, uma paz duradoura dentro e fora de suas fronteiras micronacionais, expressa no texto em destaque no quarto e quinto parágrafos:

“A nova Esparta que nasce hoje não busca subjulgar outras nações. Estaremos voltados para o estudo e para a concórdia. A guerra, traço tão característico da cultura espartana, estará presente na investida constante contra a ignorância e a intolerância que por vezes se apodera do cenário micronacional”.

Para entender contra o que o pensamento espartano micronacional se colocava naquele manifesto de fundação, é preciso voltar à conjuntura intermicronacional, bem como às vivências que os primeiros esparciatas traziam do Sacro Império de Reunião.

O protecionismo reunião sobre o fazer micronacional lusófono, aliado à sua influência e tamanho, criava um ambiente intermicronacional desbalanceado, opressivo para outros projetos grandes e pequenos, como o o Principado de Sofia, o Reino Unido de Portugal e Algarves, a República de Porto Claro e o Império Alemão gerando episódios de opressão nas listas internacionais. O SIR tinha, tradicionalmente, uma linha de frente de cidadãos que, sistematicamente, se posicionaram de forma a diminuir os demais projetos micronacionais. Oficialmente, a Chancelaria Imperial adotava uma política externa inspirada no imperialismo norte-americano, defendendo que as micronações lusófonas fossem organizadas de modo a orbitarem em torno de Reunião. O resultado das políticas reuniãs no tabuleiro intermicronacional, por óbvio, nunca foram amistosas. Os fundadores de Esparta se opunham a esta lógica e elencaram entre seus princípios um fazer micronacional menos belicoso e mais construtivo, multipolar.

“Da Grande Retra, a Constituição Espartana de Licurgo, tomaremos o que há de melhor e entregaremos ao povo espartano aquele que é o único direito que jamais deveria ser negado: a escolha.”

O trecho final do manifesto delineia os elementos que caracterizaram a Primeira Era Espartana, período que se estendeu da fundação da Pólis Esparciata, em 2008, até meados de 2011, quando se iniciou o chamado Primeiro Tempo das Cinzas.

 

Primeira Era Espartana | 2008 – 2010

Os templos e a construção da cidadania livre

O primeiro “território” digital da Diarquia Democrática de Esparta foi hospedado na rede esparta.ning.orb.br. Construído no sistema Ning, o espaço tornou-se o centro da produção espartana nos primeiros anos de atividade da Cidade-Estado. Com um sistema de rede social e fóruns integrados, o site substituía as listas do Yahoo, centralizando a produção e organizando os cidadãos esparciatas em grupos de acordo com os projetos com os quais estavam envolvidos.

Durante o primeiro ano da restauração da Cidade-Estado, as atividades espartanas concentraram-se principalmente nos templos e na Ágora, a praça pública (acessada pelo domínio agora-esparta.yahoogroups.com.br), aberta a todos os esparciatas. O reforço dos referenciais culturais e sociais helênicos era prioridade naquele momento e estava presente tanto nas relações com os postulantes à cidadania quanto nas primeiras empreitadas legislativas.

Os templos de Esparta foram os primeiros núcleos de atividade da Cidade-Estado. Pensados para operar de forma independente da Acrópole, dos Eforatos e do Conselho dos Gerontes, respondendo diretamente à Assembleia de Ápella, esses espaços centralizavam atividades inspiradas nos arquétipos do panteão helênico, incentivando todos os esparciatas a se conectarem com essas tradições. Por Esparta, prestavam serviços, principalmente no que diz respeito à produção cultural e organizativa da Pólis nascente. Alguns, como o Templo de Atena, foram dedicados à produção intelectual sobre o micronacionalismo; já o Templo de Ares chegou a abrigar atividades relacionadas às Forças de Segurança da Pólis.

O Templo de Héstia se destacava dos demais, pois os postulantes à cidadania não solicitavam um passaporte ou registro formal, mas ingressavam diretamente no templo. Dirigido pela Primeira Vestal Anne Carolin – cargo que, mais tarde, passou para J. Novaes -, o templo recebia todos os postulantes à cidadania espartana. Os recém-chegados eram inclusos em grupo fechado com uma das sacerdotisas vestais e eram apresentados, ao longo de sete dias, a conteúdos que apresentavam as bases do pensamento espartano. Aqueles que já eram micronacionalistas seguiam para a Ágora. Já os que estavam tendo o primeiro contato com o micronacionalismo eram apresentados aos conceitos elementares do hobby.

As vestais, por meio da troca de mensagens, buscavam compreender melhor os postulantes: como haviam descoberto Esparta, quais eram suas expectativas e o que esperavam da experiência. Esse alinhamento entre expectativas e realidade era essencial, especialmente para os novos micronacionalistas.

“Héstia era uma divindade que as comunidades helênicas louvavam como a protetora do lar, da lareira, da vida doméstica e da hospitalidade. Ela era a acompanhante daqueles que visitam a casa do outro. Héstia é uma divindade muito antiga, sendo a primeira a receber homenagens e sacrifícios públicos. Para os romanos, Héstia era conhecida como Vesta, e suas sacerdotisas, como vestais”

Antes de deixarem o grupo do templo para serem incluídos na lista da Ágora, os postulantes escolhiam uma divindade helênica como Patrono ou Matrona. O Templo de Héstia, então, apresentava o postulante à Ágora por meio de uma mensagem que relatava brevemente sua experiência no templo e indicava um padrinho ou madrinha, selecionado entre os esparciatas mais experientes. O padrinho/madrinha aceitava seu afilhado e, junto com ele, pensava os espaços que o novo esparciata poderia ocupar dentro da estrutura da Pólis. O processo era pensado para, com atenção para evitar exageros, o mais formal e místico possível.

Oferecer uma experiência nova para quem chegava às vestais era parte de uma estratégia maior. O Eforato de Hermes, dedicado à comunicação e propaganda, tinha como missão espalhar conteúdos sobre Esparta em grupos e nas redes sociais – que começavam a tomar força no Brasil – sobre o helenismo, cidades da antiguidade clássica e de debates sobre filosofia. Muitos chegavam, poucos ficavam. Os que decidiam ir até o fim do processo, geralmente, não deixavam a pólis facilmente.

Um dos pontos fundamentais da experiência do postulante era o entendimento do que significava a cidadania espartana. Rejeitando o exclusivismo das micronações hegemônicas, Esparta via a cidadania além das formalidades territoriais. Os esparciatas eram livres para ir e vir, trabalhar e viver onde desejassem no micromundo, sem perder sua cidadania, títulos ou vínculos com a Pólis. Os postulantes, principalmente os novos micronacionalistas, antes de pedirem oficialmente a cidadania, ainda dentro do templo, precisavam deixar claro que entendiam que, pelo menos para o Estado Espartano, sua cidadania, uma vez concedida, não seria jamais revogada.

Forjando Esparta – Regência Popular e abertura da Acrópole Espartana

A ordem na Pólis foi inicialmente estabelecida por meio da chamada Regência Pública. Mariano de Ágide foi aclamado pelos primeiros esparciatas para atuar como Regente, em uma organização ainda simbólica, sem leis ou regras além das Máximas de Sólon e Délficas. Investido pelo povo de Esparta, ele recebeu os poderes necessários para redigir as primeiras leis da Pólis. Durante a mesma assembleia, Mariano de Ágide foi reconhecido pelo povo de Esparta com os títulos de Pai Fundador da Pólis e Príncipe do Peloponeso.

Como Regente da Ápella Ancestral, o pai da Pólis nomeou os Eforatos Ancestrais (Decreto de Regência Pública/DRP nº 02/08), oficializou os símbolos da Pólis (DRP nº 03/08) e instituiu regras extraordinárias para a convocação da Assembleia de Ápella para o primeiro Conclave de Zeus (aberto pelo DRP nº 04/08). O último Decereto de Regência Pública nomeou H. Diógenes Eforato de Hermes, que passou a responder pela divulgação da experiencia espartana nas redes sociais e listas do Yahoo.

A primeira assembleia popular de Esparta teve como seus primeiros Ápellos T. Nogueira, H. Diógenes, H. Rabelo, A. Américo, A. Paiva, E. Araújo, Callis Morius (P. Penido), L. Gillipus, K. Lorhana – que mais tarde seria aclamada Rainha do Trono de Ares – F. Sales, L. Penedo, J. Novaes e Anna Carolin (segundo print do Wayback Machine da página de membros do Ning do início de 2009).

O primeiro Conclave de Zeus debateu dois temas cruciais para o desenvolvimento da Pólis: a aclamação e coroação do Rei do Trono de Mármore e o desligamento de Esparta do projeto do Império de Pacífica. A aclamação de Mariano de Ágide como Rei do Trono de Mármore foi registrada na mensagem número 407 da lista da Ágora Espartana. Com isso, a Acrópole sobre a Pólis foi oficialmente aberta.

Os documentos que registram a retirada da Diarquia do projeto da União de Estados Livres do Império de Pacífica foram reencontrados recentemente. Quiseram os deuses que as publicações fossem salvas entre os poucos e-mails que sobreviveram às recorrentes enchentes provocadas pelo Léthe. Entre os primeiros documentos divulgados pela Acrópole Espartana, o ‘Comunicado ao Micromundo’ oficializou a saída de Esparta do projeto que visava criar um bloco de Estados independentes, inspirado na União Europeia. À época, além de Esparta, outros três Estados participavam do projeto, mas não há registros sobre quais eram.

O fim da Primeira Era

Conteúdo em produção pelo Projeto Resgate de Léthê, do Núcleo de História e Pesquisa Micropatriológica da Universidade Apolíniea Espartana.

Nas próximas semanas:

Segunda Era Espartana / Era de Eleutéria – 2015 a 2018

Terceira Era Espartana / Era de Léthê – 2019 a 2024

Quarta Era Espartana / Era de Mnemosine – 2024 <